terça-feira, 22 de abril de 2014

Plataforma nove três quartos

Na cidade de São Paulo as pessoas correm como se suas vidas dependessem da velocidade que seus pés alcançam para chegar à tempo na estação de trem ou ponto de ônibus. Se o cidadão perde o ônibus que passa às 17h45 ele chegará meia hora atrasado em casa, o que significa meia hora a menos de sono, de atenção à família, do luxo de relaxar embaixo do chuveiro e mil outras coisas mais. O paulistano corre para viver.

A pressa não permite que ninguém preste atenção em ninguém ou qualquer coisa, por exemplo, quem realmente repara nos edifícios espalhados pela capital? Será que alguém notou como é raro ver o céu nessa cidade? A superfície é repleta de arquitetura e arte, graffites, esculturas e até estátuas humanas, mas ninguém nota nada.

No subsolo a situação é um pouco mais caótica, milhares de pessoas fechadas em um túnel que não foi desenvolvido para suportar metade da população paulistana, existe apenas uma escada fixa e quatro rolantes, dessas quatro duas não funcionam, o que desenvolve uma imensa onda humana de pessoas irritadas com o calor e o passo de tartaruga que são obrigadas a dar para não pisotear o ser à frente. Que caos é viver aqui!

Em alguma parte desse túnel que liga as extremidades de São Paulo, notei um trem parado com as luzes ligadas, portas e janelas fechadas e nenhum passageiro. Uma cena bizarra, quase inédita. Quando há falha no trem, normalmente, ele é retirado de circulação e enviado ao terminal para avaliação, mas aquele não, foi encostado em um trilho que permitia a circulação normal dos trens enquanto ele permanecia ali, sozinho, esperando.

A luz era amarelada e fraca, os bancos eram marrons e o tom cinza desgastado da lataria dava a impressão de que aquele trem era o objeto mais solitário do mundo, esquecido na escuridão subterrânea de uma cidade em que a população não liga para nada. Tive a impressão de que, se o trem possuísse olhos, veria lágrimas escorrerem por sua carcaça cinzenta.

A cena durou pouco mais de dez segundos, tempo suficiente para o trem no qual estava passar por aquele trecho. Imaginei que seria necessário retirá-lo de lá em algum momento, e um maquinista o conduziria por todo aquele túnel, rumo a lugares abertos e arejados, o que sem dúvida, traria um pouco de alegria àquele objeto solitário.

E é assim todos os dias para todo o mundo, o trem corre, corre, corre a toda velocidade. O maquinista tem um determinado tempo para cumprir a rota de uma ponta a outra, e é assim com cada pessoa que toma os transportes públicos. Correm, correm, correm para chegar no horário no trabalho, em casa, no aniversário de alguém, não param de correr um minuto sequer! A única maneira de pararem é se e quando o maquinista que conduz cada coração os abandonam, então os corpos desprovidos de motivação entram em pane. "Senhor, o que devo fazer? Devo parar aqui e esperar o milagre divino me salvar? Ou alguém virá de bom grado me guiar para outro lugar?".

No final das contas, sozinhos, somos todos trens descontrolados rumo à algum lugar qualquer que nem sabíamos onde era até chegarmos lá, mas, se alguém resolve abrir as portas e tomar as rédias do nosso coração, então seremos guiados para os melhores lugares do mundo.

Avante, sr. Maquinista! 

Um comentário:

  1. Esse alguém que toma as rédeas do coração é um segundo individuo ou você se refere à pessoa e seu conflito?

    Gosto de pensar que a vida poderia ser pior. Nossos momentos de contemplação não seriam tão especiais se não fossem raros.

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